domingo, 25 de agosto de 2019

Jirau

Ouvi dizer que o jirau é uma bancada ou espécie de mesa feita da maneira o mais simples possível para se colocarem objetos. Também ouvi falar que jirau é um local que serve como depósito ou um quarto improvisado. É interessante como algumas coisas funcionam muito bem feitas de maneiras bem simples e outras precisam de uma perfeição eterna e difícil de se alcançar.
Os clientes normalmente querem algo que é raro, o único, o que é difícil de se executar. Assim um por exemplo um certo alfaiate vive nessa rotina e acaba até dificultando coisas simples. Tenta fugir da rotina não seguindo roteiros, assim faz suas peças sem encomenda, com seu próprio gosto, sentindo-se vivo, livre. Tem uma boa experiência em fazer o que não gosta mas quando seu trabalho torna fácil começa a cair a suposta qualidade. Por outro lado, suas técnicas ficam cada vez melhores e seu prazer cada vez menor. Assim é raro achar um cliente interessante ou mesmo uma pessoa interessante na sua vida.
Hoje já não se tem mais lazer. Só trabalho dificultoso o distrai. Por isso não consegue se distanciar dos desafios por achar entediante.  Por mais que faça o que gosta, o trabalho endurece o ser. O descanso é bastante somente para aguentar as rotinas de trabalho. Fazer o que gosta pode-se enjoar, porém seria egoísta não oferecer seus talentos à sociedade, de uma maneira ou outra tem que se fazer alguma coisa.
Assim segue seu trabalho tentando ser no mínimo perfeito para si mesmo. Pode realizar todo o processo para confecção das mais belas peças do vestuário feminino mesmo assim ainda tem muito que aprender deste ofício. Mesmo produzindo suas encomendas as pequenas críticas ainda o afetam bastante. Se tortura a cada erro cometido mesmo sendo praticamente impossível não cometê-los uma vez ou outro. Tentando ser a si mesmo o seu melhor erro. Um belo jirau.

quarta-feira, 31 de julho de 2019

Modus operandi

Sem pieguices ou prepotência depois dos 30 deixamos de viver no modo automático. Necessitamos buscar conteúdo e nos reprogramar completamente dando sentido à nossa existência. Faz muito tempo que percebi que minha mãe se apegou bastante à religião depois dos 30 anos e partir disso percebi que acontece isso com muita gente. Alguns acabam buscando uma maneira mais filosófica de encarar a vida, ou se dedicam algum estilo de vida mais regrado ou profundo. De qualquer maneira depois dessa idade as pessoas parecem precisar dedicar sua vida de maneira mais séria a alguma coisa, pode ser até à maternidade, trabalho, carreira acadêmica ou mesmo a uma ideia.
O vida por viver da juventude vai morrendo ao chegar dos 30 e a gente se agarra a algo para lutar pela sobrevivência. Percebemos algo se destruindo em nós mesmo que corremos desesperados para vários lados e ficamos inicialmente no mínimo mais sério. Começamos a criar ditados populares que antes no máximo repetíamos alguns, precisamos de roteiros para atuação, de receita para cozinha, de conceito e partido arquitetônico, de layout, de que casamento necessita de amor, a usar gravata, a acordar cedo, a trabalhar, a cuidar da saúde, a beber se não bebia, a parar de beber se bebia, a conversar na esquina com um conhecido, a não alongar muito as conversas, a pensar na vida além da morte. Apesar de acreditarmos ou não no que vem depois da morte paramos para pensar nisso, tentamos encaixar isso na nossa maneira de viver.
Não é que sejamos mais responsáveis mas talvez tenha a ver com o peso. É uma espécie de nova necessidade essencial que antes não existia. A explicação bem explicada bem coesa nos é necessária agora. A religião passar a fazer todo sentido mesmo e isso é muito estranho, não é a mesma religião, aliás ela acaba por nos ser pouca. Criamos nossos próprios dogmas pela extrema necessidade e nos assustamos com isso, algo que talvez em 40 ou 50 ou 60 nos seja mais plausível. Criamos poemas mas queremos mais é lê-los, digeri-los. O ego da realização não algo tão satisfatório mais, nessa fase o que mais queremos é terminar o dia bem.

terça-feira, 10 de julho de 2018

Cavalo de força

Somente quer correr e procurar locais espaçosos com novos pastos. Assim também pode gastar toda sua energia sem se preocupar com os obstáculos no meio caminho. Por isso não lhe é agradável espaços pequenos ou objetos frágeis que possa quebrar, em tais espaços teria que medir sua força e correr contra sua natureza. A cidade muitas vezes lhe traz um grande desafio para respeitar os caminhos e a multidão, por isso prefere ser guiado por algum habitante experiente. Quando se trata de trabalho sua força vale mais que sua velocidade, mas persiste na sua liberdade. É domado mas não de todo civilizado, não segue o planejado e nem é refinado. Sempre busca a natureza selvagem e sente chuva na sua pele.
Pessoas desgovernados são como cavalos que convivem só com quem acompanha sua velocidade e não tem pouso certo. Pelo gosto de correr não percebem quando já esão tão longe para retroceder.
Partindo dessa analogia, eu mesmo tenho uma vontade de querer alcançar o que está mais além. De conhecer pessoas novas ignorando as sutilezas da sociais. Me interesso pelas coisas místicas que parecem não ter sentido e que não sei se me serão úteis. Assim prefiro fazer o que todos fazem para as coisas mais banais mas procuro conhecer sempre novas possibilidades.

quinta-feira, 12 de abril de 2018

A Rosário

Dona Lurdes chega na cozinha e começa dar as tarefas para o dia a Rosário:
-Passa um café novo agora pra manhã. Pro almoço faz um arroz branco, apura o feijão e uma carne de mistura. Tira as roupas que tão no tempo porque parece que chove hoje, coloque no cesto. Minto, já coloque no amarinho e chaveia pra crianças não sujarem. Coloca a coca no congelador e bate um omelete.
-Dona Lurdes precisa comprar um vidro de veja e de cândida, o omo tá no final também. Precisa fazer a feira também, comprar um mamão macho, abobrinha cabotiã, mandioquinha e cheiro verde.
-Rosário, faz que você passou pela Parigot de Souza? Será que a feira já abriu? Já abre as janelas pra entrar dar uma ventilada, essa casa abafada. Já passa um pano na sala para tirar o pó.
-Depois a senhora já me adianta algum, quero fazer mercado hoje aí hoje a noite já faço o bolo da Stepanie, vou fazer duas receitas só para o povo da vila e os parentes.
-Já vou indo antes que o sol esquente, bom dia.

domingo, 21 de janeiro de 2018

Americano

- Bom dia, por favor, me pegue um café.
- Aqui está senhor.
- Obrigado.
- Que horas são?
- Já passa das sete da manhã.
Queria comer um croissant antes deixar o local a caminho de seu trabalho. Estava um tanto jetleg pela vinho e cannabis do dia anterior. Iria a pé para o seu trabalho para economizar o dia dinheiro do ônibus. Não ligava em ir a pé, mas às vezes chegava um tanto cansado e suado no serviço que ficaria o dia inteiro. Seu almoço seria apenas um sanduíche por isso tentava economizar o máximo de energia corporal, mas está conta estava longe de chegar um a coeficiente positivo. Pois muito do seu trabalho despendia enorme energia mental.
Depois do dia de trabalho, as coisas de seu trabalho quanto mais a via, mais distante o via distante de seu trabalho, já não fazia mais sentido. Ficou deitado na sua cama e comeu algumas bolachas que tinha, leu um pouco de um livro. Foi para a frente da pensão e fumou um cigarro que o deixou totalmente atordoado. Sabia que ficaria assim mas quis correr o risco.
Foi dormir e preparar para mais um completa rotação do planeta.

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Cicatriz

Já cantavam há algum tempo que animal ferido domesticado esquece o risco. Quando passamos uma certa idade das nossas vidas desapegamos a algo que era temporário que nos tornou familiar e confortável. Depois de tanto andar com os curativos daquela ferida agora chega a hora de sarar, de deixar a cama e ir para a luta. Chega a hora de seus pais não te darem mais aquela sopa, nem talvez porque você precisasse de alguém para o alimentar, mas de alguém para te fazer companhia. Pegando o ônibus que vai para longe de sua cidade natal, que vai te afastar de sua província por muito tempo no calar da noite. Vendo as luzes da cidade passando por você até ficarem distante e apenas restar a escuridão da estrada, o barulho do motor e algumas lágrimas salgadas. É uma pele que cai e arde pela sensibilidade da nova, estranha ao mundo. O que era comum agora fica raro, o que era banal agora fica essencial. Parece estar em país estrangeiro mesmo rodeado de lugares comuns. Sabe que precisa encarar com sentimento maduro o que lhe causa temor infantil. Um temor que lhe entristece mas que não o impede. Procurando um calor fundamental à sua alma em meio a frieza do real. O real que é menos romântico que sua imaginação e se apoia no primeiro sorriso sincero descompromissado.

quinta-feira, 1 de junho de 2017

Fruta cor

Depois de uma certa idade as coisas mudam de lugar, os sinais tem outros significados.
Pablo vivia em uma agitada metrópole, encarando o trânsito diariamente para chegar ao seu trabalho. A camiseta ainda remetia ao seu passado, sua juventude, ou tal qual seria pertencente os personagens de histórias em quadrinhos. Era uma adulto jovial, um jovem atemporal, cheio de velhos costumes.
- Quer comprar chiclete? - disse o vendedor no sinal.
- Não, obrigado. - respondeu Pablo meio sem jeito.
E assim passava o rapaz que talvez teria sua idade para os outros carros. Juan, era o nome do morador de rua daquela mesma cidade. Tentando buscar a sorte na metrópole, acabou sem emprego e sem moradia. Depois de morar na casa de amigos, em albergues, acabou dormindo um dia ou outro na rua e acabou morando nela mesmo. Parecia que era o final da sua vida, estava sem esperanças mas ainda lhe restava o espírito de sobrevivência. Isso lhe fazia correr atrás de comida, de abrigo, de calor ou de um mínimo de prazer próprio. Com as esmolas que ganhara muitos vezes comprava uma caixa de chicletes para capitalizar seu dinheiro, assim daria para garantir a comida de alguns dias.
Lurdes chegara mais uma vez à praça central da cidade onde havia muitos moradores de rua, levava sopa junta com os colegas de sua igreja.
No final da tarde chovia, Pablo voltava para casa enquanto procurava alguma marquise para se abrigar e Lurdes preparava o jantar para sua família. No final das contas, essas pessoas dentre das suas diferenças não queriam ser só, sozinhos desapareciam seus defeitos e suas qualidades mas também sua vitalidade. No próximo amanhecer desempenhariam mais uma vez seus personagens e procurariam significados para isso.